Does it make any sense?! No? So, welcome.
17
Jan 08
publicado por Andi, às 21:42link do post | comentar | ver comentários (7)

Os seus passos eram decididos, pé após pé, calcorreando o chão  branco sujo da cozinha, estava bastante nervosa, não sabia se o que iria fazer ia resultar... Respirou e aproximou-se da mesa, onde Alberto se apoiava, com as mãos. Começava a ficar branco como a cal. Isso deu coragem a Fantasia.

 

Já mais perto de Alberto, a sua respiração intensificou-se, bem como o seu batimento cardíaco se acelerou,  conseguia ouvir o seu próprio coração, conseguia ouvir-se... Gostava disso,sentia-se mais ela própria.

 

Alberto, completamente atónito com aquela reacção estranha da rapariga,  afastou-se da cadeira, não fosse o diabo tecê-las!

 

Não paravam os passos. Avançava destemidamente, o som dos seus passos ecoavam na cozinha, não havia outro barulho para além desse e do seu bater do coração, pequeno como ela o imaginava, contudo tão forte e resistente que poderia bater ainda mais forte. Os passos. Boom-boom-boom. Já a um metro de Alberto, soube que era agora ou nunca, tinha que se apressar!

 

Então, correu para a porta de saída que estava trancada e cuja a fechadura antiga só tem duas chaves que a possam abrir, uma que Arminda tem sempre em sua posse, e outra, que costuma estar na gaveta de um dos armários da cozinha e que,agora, Fantasia segurava entre as suas mãos trémulas e suadas. Não conseguiu abrir à primeira, mas após a segunda tentativa,lá conseguiu pôr a chave na fechadura. Abriu apressadamente, depois do clique, que numa outra altura lhe teria dado um especial prazer, pois adorava esse tipo de coisas antigas, transmitiam-lhe uma sensação de paragem no tempo, de imutabilidade, de segurança, que o tempo não passava, e assim tinha tempo para tudo... Mas não agora, agora não tinha tempo, tinha que sair dali!

 

 

Conseguia já ver a parte de trás da Instituição,bem mais maltratada que a frente,embora essa já o fosse bastante, aquela parte da casa era totalmente selvagem, as ervas daninhas despontavam em qualquer sítio, cismando em crescer caprichosamente, as dedaleiras pendiam do coberto que lá existia, poucas pessoas iam para ali, pensando que aquele lugar provavelmente era demasiado sinistro e sombrio para se estar. Mas Fantasia gostava, nem que fosse para estar sozinha. O verde que de dia, se mostrava claro e resplandecente, àquela hora era escuro e obscuro, contudo Fantasia conseguia antever como aquele local ganharia vida com o subir do sol no horizonte, ah, como queria ficar ali deitada para poder observar esse momento, saborear o que para muitos era banal, e que, se calhar por isso mesmo, se mostrava tão cheio de maravilha para ela.

 

Passa a porta. O seu pé direito pisa a terra das traseiras, que está cheia de ervas daninhas. Estão molhadas. Sabe bem. O outro pé acompanha. O ritmo sempre acelerado. Sente que tem um tambor e não um coração, como na procissão que viram o ano passado, a que foram obrigados a vestir a farda para os dias especiais, e que conseguia ser mais odiosa que a comum, claro que tinha sido Arminda que tinha tido tal estupenda ideia.

 

Vira o tronco para poder fechar a porta. A mão! Agarra-a. Com força! E trá-la de volta para a cozinha.

 

"Onde pensas que vais?! Tu não vais a lado nenhum, vais ficar aqui a limpar o sangue no chão e vais me fazer a porra do pequeno-almoço e depois vais ficar comigo o resto dos dias comigo, pelo menos enquanto eu permanecer aqui!! E depois, irás seguir as ordens de Arminda." O seu olhar tornara-se mais estreito,incidia sobre ela apenas, o seu sangue espalhava-se um pouco sobre o pijama dele.

 

Tentou soltar-se, esperneou e tentou dar pontapés, mas não queria fazer barulho, porque sabia que se o fizesse, não teria oportunidade de fugir como pretendia.

 

Mas não o conseguia fazer, sem fazer barulho. Então numa última tentativa, deu-lhe uma dentada na mão que a segurava, com força, fincou os dentes na mão dele, bem fundo.Tão fundo que Alberto soltou um uivo de dor, mas não daqueles finos, mas sim uma voz gutural que ecoava na cozinha branca, e que vinha da sua boca imunda.

"Filha de uma puta! Vais pagar-mas por esta,e bem caro!" Vociferava Alberto, enquanto a agarrava com as duas mãos, uma delas já a sangrar e com os dentes de Fantasia marcados.  Então, tentou aproximá-la de si, olhava-a com um ar lascivo, cheio de um desejo ambíguo, um desejo de querer mostrar de que ele era quem mandava ali! 

 

Fantasia, debatia-se cada vez mais, mas não podia concorrer em força física com Alberto, ele era muito mais velho e corpolento que ela, mas não se iria deixar dobrar, não perante ele. Não percebia o que ele lhe queria fazer...

 

Alberto começou a beijá-la violentamente no pescoço, de uma forma tão agressiva, que Fantasia cada vez mais se sentia assustada. Nunca tinha sido vítima de um acto tal, uma coisa era Arminda que media forças com ela, que apresentava um especial prazer em apoquentá-la.

Parecia que ia explodir, já sentia a cabeça a rodar, mas não não podia deixá-lo ali a fazer-lhe o que lhe parecia uma perfeita nojice...

 

"ALBERTO!!" Gritou Arminda. Encontrava-se à porta da cozinha, agarrada à bengala centenária, que por algumas vezes tinha servido para dar umas lições a Fantasia, pois acordara sobressaltada com os gritos.

 

Estupefacta, só conseguia abrir e fechar a boca repetidamente.Não conseguia perceber aquele cenário. Alberto a tentar abusar de Fantasia, o sangue dos dois, espalhados pela roupa, a fúria da rapariga. Aliás, percebia, só não queria acreditar.

 

Alberto também só conseguia balbuciar umas desculpas esfarrapadas em como tinha sido Fantasia que o tinha atacado e obrigado a fazer aquilo.

 

No corredor surgiam mais pessoas.

 

Fantasia viu mais uma oportunidade para fugir, e saiu dali a correr o mais depressa que podia, ainda com o coração a bater alucinadamente, a respiração ofegante, descalça, com as roupas cobertas por sangue e mesmo a cara, devido à queda que teve na cozinha. Mas nada lhe magoava, só queria sair dali, seja para que lugar for.

 

Ainda na cozinha, Alberto tentava explicar a Arminda que fora a rapariga que o tinha atacado e provocado e ainda, falto ao respeito de uma forma muito grave. Contudo,não se quis alongar mais, e partia já para a porta das traseiras quando Arminha lhe barra o caminho.

 

"Que estás a fazer,mulher?"

"Não vais atrás dela."

"Mas assim ela vai fugir, e a culpa será tua!!"

"Se ela voltar, tu serás o culpado do seu estado, acredita que é melhor para todos assim, deixa-a ir, senão conto o que há entre nós a toda a gente!!!"

 

A cara de Alberto transfigura-se totalmente, apresenta um ar culpado, e ele recua um passo.

 

"Bem me parecia, a tua sorte é o director estar fora este fim-de-semana."

Afirmou Arminda, que virou para dentro da cozinha e que passou a arrumar metodicamente, como sempre o fazia.

 

Alberto também foi para dentro, para o seu quarto.

 

 

Fantasia corria, não conseguia pensar em nada, nem imaginar no que estava a acontecer na Instituição naquele momento,já se encontrava a atravessar o jardim. Viu um vulto lá, mas como ia tão perdida de tudo, nem o conseguiu identificar. Era Pedro. Também corria pelo jardim. De pijamas, com o cabelo castanho ao vento, e chamava por ela.

 

"Ei, Fantasia, espera, quero ir contigo, deixa-me ajudar-te!!"

 

Mas Fantasia não parou,nem olhou para trás, não o podia fazer, tinha que continuar,não sabia se lhe restavam forças suficientes para sair dali uma vez por todas.

 

Saltou o muro da Instituição. Estava fora!! Que alegria irradiava, alegria que atenuava o cansaço, o medo que sentia, mas sentiu que devia continuar, tinha de ter a certeza que escapara. Dirigiu-se para a mata que se encontrava ali perto, Pedro sempre no seu encalço, corria bem ele. Mas apesar de estar calçado, e Fantasia não, ela conhecia bem aquela mata, e ele não e portanto não pode prosseguir.

 

 

*

 

Depois de estar no coração daquela pequena mata, cheia de flores silvestres e arbustos, e ainda arvores centenárias,que exalava um odor antigo, onde havia serenidade e tranquilidade, e não havia pressa, nem medo, nem regras senão as da Natureza, Fantasia deixou-se cair no chão e ficou ali horas a disfrutar a passagem do sol pelo horizonte, por entre as ramagens volumosas das árvores mais altas, tal como tinha pensado de manhã, e pensou como aquilo era bonito, e fechou os olhos.

 


Nota: Para quem pensa que isto é um fim de Fantasia, desengane-se,não é. Ainda. Quando for aviso, se é que tem alguma importância.
sinto-me: bem :D
música: I'll wait there for you - Civilian

03
Jan 08
publicado por Andi, às 22:45link do post | comentar | ver comentários (4)

Os seguintes segundos desvaneceram-se da sua memória, pois havia apenas olhado, boquiaberta para Alberto. Aquela situação era estranha, que fazia ele àquela hora ali, na cozinha? Ele deveria-se perguntar o mesmo sobre ela. Estava de pijamas, desgrenhado, mas completamente desperto.

 

Fantasia pousa a taça na bancada, e prepara-se para sair da cozinha. Contudo, não o conseguiu fazer porque ele a interpelou:

"Para onde vais?"

Ela revirou os olhos, mostrando-lhe que não lhe devia explicações. Apercebendo-se da atitude de rebeldia e atrevimento, que aquele olhar lhe pareceu, tornou a repetir, desta vez com uma voz mais grossa, mais :

"Para onde vais?"

Obstinada e determinada como era, Fantasia repetiu o olhar, desta vez evidenciando mais a sua resposta.

"Primeiro vais-me servir o pequeno-almoço, que tenho fome!"

Tornou Alberto com uma voz de comando, a que Fantasia reagiu com uma espécie de grasnido.

 

Estaria a ouvir bem? E mesmo que estivesse a ouvir bem, estaria Alberto a falar a sério? Quereria mesmo ele que ela lhe servisse o pequeno-almoço, enquanto ele descansava aquele corpo enorme e disforme nas cadeiras brancas da cozinha? Não a conheceria já minimamente para saber que ela não se regia pelas ordens de ninguém, muito menos dele, que a desiludira tão profundamente?

 

Enquanto Fantasia perdia-se nestes pensamentos, mostrando, por isso mesmo, um ar perdido, Alberto que já começava a ficar com muita fome, demasiada para seu gosto resolveu repetir a ordem, para o caso daquela retardada ainda não o ter ouvido:

"Não ouviste? Anda lá, que estou com fome!"

 

Apercebendo-se que, realmente, Alberto estava a falar ao sério, Fantasia recusou-se de uma forma tão evidente, que Alberto começava já a perder as estribeiras. Já havera se sentado na cadeira branca, que tinha rangido ligeiramente pelo seu peso, e agora, perante tal afronta, levantou-se de rompante, fazendo a cadeira virar perante a sua fúria. O seu vulto tornou-se, então enorme, e o cabelo cinzento, desgrenhado, e ligeiramente comprido contribui para lhe dar um ar mais assustador e sinistro. Avançou na direcção de Fantasia com uma determinação inabalável, já estava farto daquela pirralha que pensava que podia fazer tudo o que quisesse!

 

Então, com uma das suas mãos grandes e guedelhudas agarrou parte dos cabelos castanhos e compridos de Fantasia, e com o joelho deu-lhe uma violenta pancada na cara.

 

Sangue. Um jorro quente de sangue esguichou do seu nariz, escorrendo lentamente pela cara dela, fazendo uma espécie de curso, até à boca. Estava um pouco desnorteada. Sentiu sangue na boca e levou a mão à boca, ainda recuperando do choque. O nariz, na altura não lhe estava a doer, mas sentiu uma dor imensa, algo havia despertado nela, uma raiva e ao mesmo tempo pena por aquele homem que estava à sua frente. Que desprezível ser... Sentia ganas de o abanar, de o atirar contra as paredes, de o fazer experimentar o mesmo sabor quente do sangue, queria fazê-lo sentir indefeso, queria que ele soubesse o que era ser humilhado, queria...

 

Não. Não iria fazer nada disso, já decidira o que fazer, algo muito mais eficiente que isso. Tentou levantar-se. Uma mão no chão, uma mão na anca que estava magoada devido à queda que dera no chão, o uniforme sujo, o fio de sangue que pendia, o chão sujo, e ele, ali a rir-se na sua cara.

 

"Agora vai saber como obedecer-me e obedecer a Arminda, e a não se meter com os colegas!" Pensou Alberto, ainda com fome, convicto que Fantasia decerto lhe prepararia agora o pequeno-almoço. Em passadas largas, dirigiu-se para a cadeira que derrubara anteriormente, endireitou-a e sentou-se. Passou a mão pelo cabelo grisalho e tentou compô-lo.

 

Já de pé, Fantasia dirigia-se na direcção da gaveta onde se arrumava os talheres, os saca-rolhas, as facas, algumas chaves velhas, e pequenos objectos metálicos que aparentemente não tinham função alguma, mas que um dia, na opinião de Arminda iriam servir algum dia para algo.

 

"Preparas-me então o pequeno-almoço?"

Inquiriu Alberto. Fantasia acenou que sim com a cabeça. O sorriso de triunfo bailava nos lábios de Alberto, o que ainda provocou mais Fantasia. Fingindo então que iria preparar o pão, Fantasia abriu a dita gaveta, retirou de lá o que queria e decidiu fazer o que havera pensado.

 

O sol começava já a entrar na cozinha com uma vivacidade tal que não tardaria estaria toda a gente acordada...

 

Com os olhos semi-cerrados por causa da luz que entrava abundantemente pela janela, Alberto viu Fantasia avançar na sua direcção e percebeu que ela não iria de forma alguma preparar-lhe o pequeno-almoço....

sinto-me: gostava de poder dizer...

24
Nov 07
publicado por Andi, às 23:13link do post | comentar | ver comentários (3)

Existem várias coisas que não compreendo e acho completamente irracionais. Existem outras que me irritam pelas mais variadas razões. E ainda existem outras que, simultaneamente,me irritam e que eu não compreendo de todo!

 

A violência doméstica faz parte dessas coisas que abomino e que não têm qualquer razão de ser. É algo que mexe comigo, que me revolta profundamente! Costumo ser uma pessoa pacata, mas existem estas coisas que me tiram completamente do sério. Estarão-se a perguntar o porquê desta divagação... Bem isto vem em consequência de uma notícia que vi. Oito mil mulheres em nove meses... Isto são os casos em que houve denúncias, eu nem quero pensar no número REAL de mulheres que sofre violência, na maior parte das vezes, do rico maridinho... Este número  de casos, só destes nove meses, foi superior ao de 2006. A cada momento que passa irrito-me mais um pouco. Talvez devesse pensar pelo lado positivo (?!) e acreditar que o número aumentou, não porque a violência aumentou, mas sim porque o número de denúncias aumentou... Infelizmente não consigo ser tão optimista.

 

Amanhã é o Dia Internacional para Eliminação da Violência Contra a Mulher. Solidarizo-me com todas essas vítimas que de uma forma ou de outra sofrem violência, não apenas física. Existem vários tipos de violência, para mim a discriminação é uma espécie de violência. A perspectiva altva com que alguns homens, e mesmo mulheres, infelizmente,  têm do sexo feminino é deprimente. A ideia enraizada desde séculos que a mulher é um ser frágil e inseguro, que necessita de um homem para se guiar e que não é tanto capaz de certos feitos como os homens leva, inconscientemente, a uma submissão perante os homens. Felizmente algumas mulheres já se livraram da ideia de inferioridade. Não digo que todas sejamos assim, mas por vezes existe uma ideia de incapacidade, se bem que muitas vezes inconsciente, que nãonos eprmite arriscar, dar um salto! Não digo que haja uma igualdade entre os dois sexos, na verdadeira acepção da palavra, porque tal é impossível.  Poderia sim haver uma igualdade perante a lei, uma igualdade de direitos, em qualquer direito, desde os mais insignificantes até aos mais importantes.

 

Já fui confrontada com algumas situações em que o único factor que contou foi o facto de ser mulher, mas nunca deixei que me fizessem sentir inferior e humilhada. Espero que nunca se sintam também!


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